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Era um daqueles dias cansativos. Teve que vir de ônibus, o carro resolveu estragar justamente quando se precisava tanto dele. Estava estressado, com raiva. Ônibus lotado. Ele se sentia totalmente deslocado ali dentro, com sua pasta não mão direita e seu terno, na esquerda, pendurado, tentando achar seu lugar dentro daquela lata de sardinha, numa daquelas hastes verde-limão. Todas as ligações que ele tentou fazer tinham dado errado; todos os negócios, que ele ansiava fechar hoje, tinham dado errado. Nada estava sendo do jeito que ele queria. 
Quando ele finalmente conseguiu sair do ônibus, tentando achar as forças pra caminhar o longo trecho a pé que, de carro, ele faria em menos de dez minutos, começou a chover. A chuva caía em pingos finos e constantes e incomodava. De súbito, ele parou. Prestou atenção no jeito que a chuva lhe tocava. Havia quantos anos desde a última vez que ele se deixara molhar pela chuva? 
Deixou a pasta sob a cobertura de um orelhão, tirou os sapatos e se sentou no meio fio. Por mais de uma hora, ali, sentado, com a chuva, como uma velha amiga, lhe fazendo cócegas, assistindo a rodas dos carros desfilarem na água que escorria rua abaixo, ele pensou no quanto, de verdade, ele devia estar feliz.

4 comentários:

  1. um "obs" por esse ser um pouco diferente dos demais.

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  2. isso aconteceu comigo outro dia...chuva é mesmo um recado da felicidade.

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  3. "Assistindo a rodas dos carros desfilarem na água que escorria rua abaixo"

    Isso me faz feliz! *-*

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