So did mine

Eu corria como um louco. Era tarde da noite; o barulho dos carros cessara quase por completo; não havia ninguém por perto. A cidade estava vazia. Eu tentava deixar para trás tudo aquilo que tentava me destruir; faziam meses que aos poucos meu corpo era dilacerado; em meus braços feridas enormes, em minhas pernas faltavam pedaços; mais um pouco e minha cabeça seria arrancada.
Eu descia ainda correndo por uma rua estreita com postes de luzes amarelas. Aquele silêncio agoniava; só o barulho dos meus passos, pesados na calçada de paralelepípedos. Que horas eram? Parecia que eu corria há horas e sentia que não estava me distanciando. Era como se aquela coisa estivesse presa a mim; eu podia sentir seu calor gelado soprando meu corpo, sentia aquele arrepio congelante que da nuca descia pelas minhas costas. Eu suava frio.
Ao virar a esquina, parado na outra esquina havia um homem. Eu. Não conseguia ver seu rosto, mas sua presença me amedrontava. Pensei em desviá-lo – atravessando a rua, talvez – mas havia algo naquela figura deveras familiar que me atraía a ela! Parei de correr e segui em passos cautelosos até ele; eu não sabia o que aquilo significava, mas, com razão, temia que bem não me faria. Chegando mais perto, consegui ver seus olhos; eram frios, negros como a escuridão que nos rodeava – parecia que em seu redor havia uma aura escura. Aquele não era eu, mas era o que eu me tornaria. Poucos segundos depois, eu seria algo que só existe em algum lugar inatingível. Poucos se lembrariam de mim.
[...]
Eu havia planejando todos os detalhes minuciosamente. E sabia que nada sairia do jeito que eu queria. Preferi, na última hora, abandonar o plano e apenas executá-lo. Naquele momento, o fim era mais importante que o meio. Não sei por quanto tempo esperei; tudo o que lembro não é de muito antes de nosso rendezvous.
Esperei naquela velha esquina. Eu sempre vinha àquele lugar. Sabia que procuraria aquele lugar numa hora de desespero. Meu medo o traria a mim. Em pé, esperei. Minhas mãos geladas não ajudavam a esquentar o aço frio que tentava esconder em meus bolsos.
Como um boneco mal manipulado, como esperado, eu virei a esquina como um louco fugindo do invisível, com um medo irracional, infantil e doentio estampado no rosto. Seus olhos eram de súplica, me olhavam como se eu fosse sua última esperança. Sem ter consciência disso, com isso, ele assinava sua sentença de morte.
Sem pensar duas vezes, por já ter pensado inúmeras vezes antes, atirei-lhe no peito e ele caiu duro no chão frio. Seu rosto exprimia alívio. O meu também. Ele morria. Não deixava filhos nem testamento conhecido. Era menos um que vivia.
Juntei o corpo e joguei sobre os ombros. Por um tempo, como castigo, tenho que carregá-lo por onde quer que eu vá. Seu medo irracional me seguirá por uns tempos. E quando terminar de me corromper, eu serei morto, como todos os outros antes de mim. Em breve, todos seremos mortos, um a um.
[...]

3 comentários:

  1. Caraiooooooooooooooo mano! Pirei demaissssssssssssss nisso! Lendo uma vez fica meio confuso! Mas prestando atenção, da pra pirar muito! Pago pau pra vc, quantos tuh quer?^^

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  2. esse é o tipo de comentário que eu deveria fazer num msn ou coisa que o valha, mas quero postar aqui até pra fazer uma propaganda do fantasia orgânica (que, por sinal, é muito bom também). esse medo irracional da sua personagem me parece muito com o peso dos pensamentos da Maria/Adriana. só que em um o cara foge, e no outro a pessoa vai se consumindo até começar tudo outra vez. enfim, gostei.

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  3. o que me lembra também foi um conto que eu li do kafka, que vc com certeza vai acabar lendo depois, mas é só por causa do cenário. eu sempre imagino as coisas em curitiba, e nos textos do kafka as piras se davam em praga. mas não sei, as duas curiosamente me parecem tão simétricas...

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